quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

BETINHO ESTÁ PRESENTE

O poder transformador da cultura
Por Herbert de Souza*

Primeiro tocou a orquestra. Depois as cortinas se abriram e comecei a cantar. Tinha nas mãos a letra de Apesar de você, hino da resistência à ditadura que, em algum momento, todos nós tínhamos cantado nas ruas, nas praças, nos bares, nas esquinas. Difícil mesmo era entender, sob os holofotes do Teatro Municipal e à luz da razão, a emoção de estar ali.

Na coxia, mais de quinhentos artistas se preparavam para entrar em cena e, fosse por música, canto, dança, teatro, começar a mudar este país. Mudar no imaginário, na fantasia, na criação. Mudar no faz-de-conta, no palco, na loucura, Mas quanto há de loucura em querer mudar este país?

Durante as cinco horas de espetáculo que se seguiram, mudar se provou possível. Transformar na fantasia é o primeiro passo para transformar na realidade, é provar que recriar o Brasil é preciso e possível. Em cada cena, a arte emocionava, fazia rir, chorar. E cada um de nós, espectadores da imaginação alheia, nos encantávamos com um espetáculo que, além de todas as suas proezas, nos mostrava o quanto pode o mundo da cultura.

Estávamos em meados de maio quando, numa primeira reunião no restaurante do Teatro Municipal, cerca de trinta significativos representantes de todas as áreas aceitaram o desafio. Fazer arte contra a fome, fazer arte a partir da fome, fazer fome virar arte. Carregava então a mesma convicção que me move ainda. A de que um país muda pela sua cultura, não pela sua economia, nem pela política, nem pela ciência.

Aos poucos, os artistas começaram a se organizar, discutir, divergir, construir e reconstruir idéias, vontades, desejos, sonhos. Foram meses de dedicação. Mas, mais importante do que o tempo entregue a cada discussão foi dedicar cada arte, cada gest

o, cada tom, cada som ao outro, à solidariedade. O gesto de dar, de entregar, de somar. Não apenas exibir, mas doar e oferecer.

A cultura está entre nós, sempre. É no campo da consciência que o mundo se faz ou se desfaz, é nesse universo da imagem, do som, da ação, da idéia. Tudo se resolve na criação. É na invenção que o tempo volta atrás e o atrás vai para frente. É onde o homem vira bicho, bicho conversa com gente. É onde eu sou Guimarães, você é Rosa. É onde fica dantes ou tudo muda num átimo. É onde você se entrega de mãos amarradas ou se rebela de faca no dente. É onde o silêncio vira pedra ou o grito rompe tudo e esparrama vida por todos os poros. E onde o riso chora e o choro é o começo da cura.

Foi o mundo da cultura que primeiro aceito o desafio de mudar. De criar um outro Brasil. Sem pobreza e sem a arrogância dos ricos. Sem miséria, definitivamente. Um Brasil totalmente simples, mas radicalmente humano. Um Brasil onde todos comam todos os dias, trabalhem, ganhem salários, voltem para casa e possam rir, beijar a mulher amada, a filha que emociona, abraçar o amigo na esquina, se ver no espelho sem chorar pelo que não realizou.

Essa mudança começou a ser feita. Com sons, imagens, ação, idéias, e

moções. Essa mudança começou a ser feita com gente. E gente é, antes de tudo, cultura. Caldo de gente é cultura. Sumo de gente é essa parte divina que cada diabo carrega dentro de si. O mundo imaginário é onde, do duelo entre Deus e o diabo, não é possível prever o resultado. E é pela brecha da cultura que podemos dar o salto para o reencontro do país com a sua cara. Buscar o que é grande em cada um, buscar a possibilidade de fazer da felicidade o pão nosso de cada dia. É esta a vida e a nossa busca. É esta a fome e a nossa morte.

A cultura apareceu para construir no campo arrasado, para levantar do chão tudo que foi deitado. E descobrir, enquanto é tempo, que o importante é ser cidadão, é ser gente. O que importa é alimentar gente, educar gente, empregar gente. História é gente. Brasil é gente. E descobrir e reinventar gente é a grande obra da cultura. Uma obra que será nossa. Será porque a cultura continua a pensar, discutir, reunir, transformar.

A arte sabe e quer dizer mais, muito mais. A arte tem o poder de transformar, nem que seja primeiro na ficção, na imaginação.

Terminando o espetáculo, de volta aos bastidores, o mundo da cultura está desafiado a continuar pensando, fazendo, mexendo, revolucionando. Até aqui, foi grande. Mas o grito deve ecoar sem parar, o gesto feito deve continuar, entrelaçando ações, abraçando em solidariedade. Uma nova consciência deve criar o mundo novo e enterrar a miséria e a exclusão para sempre. Uma cultura que busque no fim de cada atalho uma reta. Que busque em cada ponta de sofrimento uma alegria. Que busque em cada despedida o reencontro. O Brasil está aí para ser criado, recriado. Essa criação apenas começou. E a ação de criar e recriar é a nossa cultura.



*Herbert José de Sousa, conhecido como Betinho, (Bocaiúva - MG, 3 de novembro de 1935 — Rio de Janeiro (RJ), 9 de agosto de 1997) foi um sociólogo e ativista politico que sempre lutou na defesa dos direitos humanos. Concebeu e dedicou-se ao projeto Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida.

Este artigo foi publicado originalmente na Folha de São Paulo, em 20/09/1993, e republicado no livro “Ética e Cidadania” [Carla Rodrigues e Herbert de Souza. São Paulo: Moderna, 1994, Coleção Polêmica, p.16-18], está disponivel no site da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O "VALE DA VIDA" AINDA REQUER ATENÇÃO

É bom pensar no futuro...

Não podemos continuar pensando que tudo está bem somente por conta de que um dia foi pior. Cubatão é uma cidade rica e importante economicamente para o país, não adianta pensar que fazer vistas grossas vá resolver o que ainda resta. É necessário se aprofundar nos debates e não temer os desafios a serem propostos.






Somente com muita força de vontade é que vamos vencer as demandas e dar ao nosso povo a condição de vida que ele merece.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

REVERÊNCIA AO DESTINO: Carlos Drummond de Andrade

Reverência ao destino


Falar é completamente fácil, quando se tem palavras em mente que expressem sua opinião.
Difícil é expressar por gestos e atitudes o que realmente queremos dizer, o quanto queremos dizer, antes que a pessoa se vá.

Fácil é julgar pessoas que estão sendo expostas pelas circunstâncias.
Difícil é encontrar e refletir sobre os seus erros, ou tentar fazer diferente algo que já fez muito errado.

Fácil é ser colega, fazer companhia a alguém, dizer o que ele deseja ouvir.
Difícil é ser amigo para todas as horas e dizer sempre a verdade quando for preciso.
E com confiança no que diz.

Fácil é analisar a situação alheia e poder aconselhar sobre esta situação.
Difícil é vivenciar esta situação e saber o que fazer ou ter coragem pra fazer.

Fácil é demonstrar raiva e impaciência quando algo o deixa irritado.
Difícil é expressar o seu amor a alguém que realmente te conhece, te respeita e te entende.
E é assim que perdemos pessoas especiais.

Fácil é mentir aos quatro ventos o que tentamos camuflar.
Difícil é mentir para o nosso coração.

Fácil é ver o que queremos enxergar.
Difícil é saber que nos iludimos com o que achávamos ter visto.
Admitir que nos deixamos levar, mais uma vez, isso é difícil.

Fácil é dizer "oi" ou "como vai?"
Difícil é dizer "adeus", principalmente quando somos culpados pela partida de alguém de nossas vidas...

Fácil é abraçar, apertar as mãos, beijar de olhos fechados.
Difícil é sentir a energia que é transmitida.
Aquela que toma conta do corpo como uma corrente elétrica quando tocamos a pessoa certa.

Fácil é querer ser amado.
Difícil é amar completamente só.
Amar de verdade, sem ter medo de viver, sem ter medo do depois. Amar e se entregar, e aprender a dar valor somente a quem te ama.

Fácil é ouvir a música que toca.
Difícil é ouvir a sua consciência, acenando o tempo todo, mostrando nossas escolhas erradas.

Fácil é ditar regras.
Difícil é seguí-las.
Ter a noção exata de nossas próprias vidas, ao invés de ter noção das vidas dos outros.

Fácil é perguntar o que deseja saber.
Difícil é estar preparado para escutar esta resposta ou querer entender a resposta.

Fácil é chorar ou sorrir quando der vontade.
Difícil é sorrir com vontade de chorar ou chorar de rir, de alegria.

Fácil é dar um beijo.
Difícil é entregar a alma, sinceramente, por inteiro.

Fácil é sair com várias pessoas ao longo da vida.
Difícil é entender que pouquíssimas delas vão te aceitar como você é e te fazer feliz por inteiro.

Fácil é ocupar um lugar na caderneta telefônica.
Difícil é ocupar o coração de alguém, saber que se é realmente amado.

Fácil é sonhar todas as noites.
Difícil é lutar por um sonho.

Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata.


Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O HOMEM E O MENINO

O homem e o menino...


Hoje passou um filme em minha mente... O ano é 1988, eleições municipais, uma criança entra no seio de uma eleição sem saber direito o que aquele momento representava, muito menos o futuro que lhe aguardava. Era apenas uma campanha. O garoto apenas um acompanhante, viu lugares inimagináveis, teve sensações de alegria e medo. Não entendia muito, mas parece que aprendeu um pouco.

Aquele homem cheio de disposição e carinho que levava consigo o garoto, nunca lhe deixou sem uma atenção especial, e mesmo perto de completar 30 anos de vida era tratado por aquele homem como todo o carinho dos tempos de criança.

A vida impôs caminhos que distanciaram os corpos, mas não os espíritos. E a cada reencontro era uma tremenda alegria. Compartilhar as histórias, relembrar momentos que já haviam sido relembrados milhares de vezes, mas o importante era sorrir com a mesma intensidade e saber que ali estava viva uma história de família que vem de longa data, bem antes do garoto nascer.

História construída em uma cidade pequena do litoral paulista, cidade que se viu invadida pela industrialização, mas que suas raízes mantiveram se firme através de homens e mulheres que souberam ver a cidade crescer, receber irmão de todas as partes do país, com eles conviver e aprenderam também a junto deles ganhar o mundo. Ou como se diz na gíria da classe trabalhadora: “correr o trecho”. E foi de trecho em trecho, foi na beira dos campos de várzea, foi no dia a dia da batalha cotidiana pela sobrevivência que este homem se abriu para o mundo, fez amigos e para a vida se formou.

Muita coisa poderia ter acontecido, mas a vida se encarregou de colocar um menino em seu caminho. No momento certo o homem entra pela porta da casa de um grande amigo e recebe um convite. Não recusou. A partir dali estava traçada a junção do destino dele à aquela criança.

Menino que ele levou para o “olho do furacão” de uma campanha, sem saber o que poderia acontecer. O menino que anos mais tarde decidiu despertar-se para além das campanhas e foi para o “olho do furacão” da política, talvez despertado pelo seu subconsciente. Imagens hoje que se revelam muito atuais, parece que foi ontem.

Todos eram conduzidos em uma gloriosa Brasília, ou será uma Variant, isso pouco importa agora, mas foi uma companheira de aventura e tanto. Ela na maioria das vezes era guiada pelo seu inseparável companheiro de trabalho e de vida, que nas jornadas muitas vezes levava sua filha, da mesma idade do menino, para adentar à aquele universo desconhecido das criaças. O garoto recorda isso desde sempre, com um saudosismo sem igual.

E a vida prosseguiu, muita coisa aconteceu. Apesar da idade avançada o grande homem se casou. Foi uma lição de amor à vida e ao próximo. Reconstitui sua vida ao lado de uma grande e maravilhosa mulher, que teve por anos tão perto dele, e ele sequer imaginava que ali estava alguém que tanta admiração tecia por ele. O homem adoeceu, agora ele tinha uma família que buscava lhe dar o conforto e carinho que em boa parte da vida ele nunca recebeu. Já o garoto, continuava sua caminhada, lutando, seu objetivo era mostrar que todo carinho que recebeu durante anos havia de ser retribuído de alguma forma, mesmo que essa forma fosse através de uma incansável batalha para fazer com que a cidade que aquele homem viveu como menino, algum dia tivesse ares do recanto em que vivera as aventuras dos bananais.

No ultimo encontro o garoto anunciou ao homem que estava diante de um dos grandes desafios de sua vida. E que não demoraria muito para comemorar juntos o progresso da vida de ambos. O homem sorriu, disse que estava orgulhoso e feliz. Disse ao manino para seguir adiante e ganhar o mundo, E lá foi o menino, cheio de energia, levando na mente as palavras do homem que lhe dava uma lição da luta pela vida.

Mas não deu tempo, o homem se foi! O menino ficou! Chegou em casa pra dar uma noticia, e recebeu "a noticia". Um choque, uma surpresa, um sentimento. Mas este menino teve uma boa escola de vida, sabe quanto é difícil nessa hora conter os sentimentos mais profundos, mas o fez. Se conteve diante do respeito ao peso da trajetória do homem. Aquele que em momento algum na vida lhe demonstrou momento de fraqueza ou tristeza, diante do menino sempre foi o mais feliz. Não era fácil tentar não pensar no ocorrido. Mesmo sabendo de que este é o ciclo natural da vida, nestas horas não há escolha, só a compreensão.

Infelizmente não foi possível lhe ver pela ultima vez, não foi possível lhe dar o ultimo abraço, nem mesmo lembrar mais uma vez daquelas aventuras de 1988 como se tivessem acontecido ontem, não deu tempo da ultima risada, não deu!

Mas ficou o seu legado de vida, as lembranças dos amigos, as histórias eternizadas e a vontade do menino, de retribuir mesmo agora todo amor recebido por anos, mesmo que de forma escrita.

O homem, José dos Santos Páscoa, o menino, Fabrício Lopes da Silva, seu afilhado!



domingo, 12 de junho de 2011

POEMAS QUE INSPIRAM

Vida

Já perdoei erros quase imperdoáveis,
tentei substituir pessoas insubstituíveis
e esquecer pessoas inesquecíveis.

Já fiz coisas por impulso,
já me decepcionei com pessoas
que eu nunca pensei que iriam me decepcionar,
mas também já decepcionei alguém.

Já abracei pra proteger,
já dei risada quando não podia,
fiz amigos eternos,
e amigos que eu nunca mais vi.

Amei e fui amado,
mas também já fui rejeitado,
fui amado e não amei.

Já gritei e pulei de tanta felicidade,
já vivi de amor e fiz juras eternas,
e quebrei a cara muitas vezes!

Já chorei ouvindo música e vendo fotos,
já liguei só para escutar uma voz,
me apaixonei por um sorriso,
já pensei que fosse morrer de tanta saudade
e tive medo de perder alguém especial (e acabei perdendo).

Mas vivi!
E ainda vivo!
Não passo pela vida.
E você também não deveria passar!

Viva!!

Bom mesmo é ir à luta com determinação,
abraçar a vida com paixão,
perder com classe
e vencer com ousadia,
porque o mundo pertence a quem se atreve
e a vida é "muito" para ser insignificante.


Augusto Branco

domingo, 29 de maio de 2011

UM POUCO DE POESIA


BONS AMIGOS


Abençoados os que possuem amigos, os que os têm sem pedir.
Porque amigo não se pede, não se compra, nem se vende.
Amigo a gente sente!

Benditos os que sofrem por amigos, os que falam com o olhar.
Porque amigo não se cala, não questiona, nem se rende.
Amigo a gente entende!

Benditos os que guardam amigos, os que entregam o ombro pra chorar.
Porque amigo sofre e chora.
Amigo não tem hora pra consolar!

Benditos sejam os amigos que acreditam na tua verdade ou te apontam a realidade.
Porque amigo é a direção.
Amigo é a base quando falta o chão!

Benditos sejam todos os amigos de raízes, verdadeiros.
Porque amigos são herdeiros da real sagacidade.
Ter amigos é a melhor cumplicidade!

Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho,
Há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!

Machado de Assis

terça-feira, 8 de março de 2011

SAMBA E LUTA

“Plantar o pão, colher a vida:
para o mundo se alimentar sem veneno”





Canta povo brasileiro
Batucada é de bamba
Hoje a Lona Preta vem dizer, dizer
A luta é o tempero do meu samba

Oh Mãe Natureza
Nós queremos a tua diversidade
De cores, sabores
Na mesa do campo e da cidade
Agroecologia
Com soberania alimentar
Pra preservar o nosso chão
Um novo mundo pede uma nova relação
Do jeito que tá, não dá pra ficar
A produção

Comida ruim ninguém aguenta, ninguém aguenta
É veneno em todo canto, em todo canto
Mata gente e mata rio, e mata rio
Agronegócio a mentira do Brasil

Semente com patente é roubar a natureza
Monocultura na agricultura
Deserto verde: cadê a beleza?
Lucrando e fazendo a guerra
Matando o ser humano e a mãe terra

A luz
Do companheiro Keno
Ta na memória
De quem ocupa a avenida
Presente que aduba a sua história
Colhe o pão da vida